Em "Adventures in the Orgasmatron", de Christopher Turner, encontramos um parágrafo muito interessante. At
the sexology seminar, not long after they began seeing each other,
Reich delivered a thirteen-page paper on the orgasm: "Coitus and The
Sexes." It was his first reference to the topic that would
intellectually captivate him for the rest of his life, though he did not
yet connect the libido or orgasms to politics. Reich sought to answer
the question posed by a contemporary sexologist: why were the male and
female climax so infrequently simultaneous? This wouldn't be the case if
castration fears were eliminated and tender and sexual impulses were
allowed to coincide, Reich boasted, hinting at a new sexual assurance
with Annie Pink.
É
Wilhem Reich que é referido nesta citação. Estava-se no período entre
as duas Grandes Guerras. Reich era o mais novo, do círculo de Freud. A
psicanálise começava a afirmar-se, com muitas resistências, em Viena.
Nesta cidade, os sociais democratas, que a governavam quase como um
enclave, tinham levado a cabo uma série de reformas sociais. Havia uma
clínica de psicanálise que dava consultas gratuitas, a quem não tinha
condições para pagar. O mesmo modelo foi usado em Berlim. Estas medidas,
bem como o tratamento de soldados com traumas de guerra e a influência
que alguns psicanalistas tinham, na vida social e política, iam
conseguido ganhar alguma reputação à nova disciplina. Mas, ainda assim,
eram os primeiros passos.
Nesta
altura, começavam a ser frequentes os seminários de sexologia. E junto
de alguns círculos, mais ligados à anarquia, o sexo era visto como algo
de eminentemente político. Como é dito no parágrafo, Reich, ainda não
via o potencial político do orgasmo. Mas era influenciado por este
interesse que a sexualidade humana gerava, quer juntos dos
psicanalistas, que sempre a viram como essencial e agora a começavam a
estudar também de forma mais específica, quer junto de grupos mais
politizados.
O que acho interessante neste
parágrafo é que expõe o que me separa de quase um século de estudo da
sexualidade no ocidente. Estou, obviamente, muito grato à sexologia e
reconheço-lhe os méritos. Mas, e sei que a frase é estranha, parece-me
que se reduz o sexo à sexualidade, ou melhor, parece-me que se reduz o
sexo à sexologia, ou que se vê o sexo sempre através da sexologia.
Os seres humanos, sabemos porque
sabemos da evolução, não foram criados já com esta forma. Evoluíram ao
longo de milhões de anos. Encontrar a causa do facto de ser raro homens e
mulheres terem orgasmos simultâneos no medo da castração parece-me
ridículo. É como se partíssemos do que somos agora, nesta forma, humana,
e nos debruçássemos para olhar para o nosso corpo, a nossa biologia,
que demorou muito tempo a desenvolver-se. E não conseguíssemos imaginar
mais nada a não ser personalidade, trauma, psique, cultura humana. Há
várias teorias, muito mais plausíveis, para explicar porque é que os
orgasmos do homem e da mulher não coincidem. Há umas dezenas de milhares
de anos, quando a competição por uma fêmea, por garantir que os genes
do macho eram passados, era semelhante à de outros animais, uma
ejaculação rápida era uma vantagem evolutiva. Demorar demasiado tempo,
era arriscar que viesse outro macho e nos impedisse de fecundar a fêmea.
Como a evolução é lenta, comparada com o tempo humano, ainda não
mudámos, por muito que os nossos hábitos sexuais sejam completemante
diferentes e autónomos em relação à origem biológica da nossa
sexualidade. É uma teoria, entre outras.
Eu não concebo uma tentativa de
perceber a sexualidade humana que não parta da biologia humana. E,
obviamente, seja holística, inclua a psicologia, a antropologia, todos
os aspectos e as áreas científicas que ajudem a ter uma visão mais
global, contextualizada. E, para que seja verdadeiramente
contextualizada, nunca poderá ser retirada do contexto da natureza, da
comparação com os outros animais, quer dos que são parentes próximos,
quer dos parentes mais afastados. Uma das minhas próximas leituras será a
do Why is Sex Fun, do Jared Diamond,
que fala da sexo dos humanos precisamente sob um ponto de vista
evolucionário. A sexologia emergiu, pelo pouco que pude entender, da
psicanálise. E isso deu-lhe uma perspectiva, um ângulo, uma forma de
olhar para o sexo. Que não partilho.
Prefiro o sexo. Acho muito mais
interessante a forma como, noutras culturas, durante milénios, se
estudou o sexo, o que se passa quando as pessoas o fazem, como fazê-lo
melhor e, porque nessas culturas o sexo é geralmente considerado uma
forma de, pelo corpo, transcender a matéria, como chegar a algo de
precioso, que faz com que valha a pena aprender técnicas, passar a vida
como aprendiz. No ocidente, a psicanálise e a sexologia pretendem
livrar-nos dos traumas, para que possamos apreciar o sexo sem culpa nem
medos. E, porque temos uma visão romântica do sexo, achamos que a culpa e
o pecado são sexys e que o que seja técnica só estraga, só vem tornar o
acto menos natural. Pois eu prefiro o sexo à sexologia.
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